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Reviews e Análises

Review: Graphic MSP – Jeremias – Pele

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Não sou negro. Nunca passei pelo preconceito que os negros passam no nosso país todos os dias. Sempre fui da elite branca privilegiada. Não posso falar sobre preconceito por conta de minha pele ou etnia. Nunca passei por isso. Sofri bullying no colégio quando menino, mas nunca por conta da cor da minha pele. Mas já vi muita coisa desse gênero.


Mesmo assim, foi com essa minha bagagem privilegiada que me emocionei e me identifiquei com a história da mais recente Graphic MSP: Jeremias – Pele. Com roteiro de Rafael Calça e desenhos de Jefferson Costa, a graphic novel conta a história do menino Jeremias, um dos personagens mais antigos de Maurício de Sousa, mas que nunca recebeu o protagonismo das histórias. Talvez uma aqui ou outra ali, mas nada como os outros personagens da Turma da Mônica.


Sem contar demais, pois essa é uma revista que todo brasileiro deveria ler, Jeremias – Pele fala sobre um excelente aluno de uma escola de São Paulo que um dia descobre o lado mais deplorável do ser humano ao ser vítima do puro e simples preconceito. Em uma narrativa simples, mas que vai escalonando aos poucos, o inocente Jeremias vai aos poucos se dando conta de que a vida para o negro no Brasil é bem mais difícil do que para grande parte da população.



Os autores conseguem passar essa mensagem sem forçar a barra com muito melodrama, mas mostrando situações comuns do dia-a-dia que todo afro-descendente já passou nesse Brasil: ser rebaixado por algum colega por conta da sua cor de pele; ser revistado pelo guarda no meio da rua, sem motivo algum; ter seus cabelos escondidos ou cortados por ter o cabelo “ruim” ou “diferente”; ninguém sentar do seu lado por puro preconceito.


A cada página, a narrativa vai ficando cada vez mais pesada e doída. O sentimento tanto de Jeremias quanto da família dele é transmitido ao leitor de forma contundente e firme, sem doutrinação ou vitimismo, mas com realidade e a crueza da verdade estampada na nossa cara todos os dias na ruas desse país e que a gente prefere ignorar.


Alguns momentos mais marcantes da graphic novel chegam a doer no coração. O discurso do pai, o preconceito vindo de quem se espera mais, as lições que a vida traz, o xingamento, todos esses pontos são cuidadosamente tratados pelo roteiro de Rafael Calça e traduzidos com a estilosa arte de Jefferson Costa, exatamente para que se sinta na pele o que grande parte da população passa todos os dias.


O meu desejo era que Jeremias – Pele fosse transformada em um brado sobre o preconceito no Brasil e adotada como literatura básica nas escolas primárias, para que as nossas novas gerações de crianças entendam e aprendam que o caminho da discriminação é destrutivo e abominável. Um trabalho brilhante.


Nota 5 de 5

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A Hora da Estrela – Crítica

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Quando se é aficionado por livros é comum alguma mania: ler a última página, tentar não “quebrar” a lombada de calhamaços enquanto se lê ou usar qualquer coisa que estiver a mão como marcador de páginas. Eu coleciono primeiros parágrafos: escrevo em pequenos cadernos que guardo na estante junto com os volumes que lhes deram origem. Claro que existem os favoritos como o de Orgulho e Preconceito (“É uma verdade universalmente conhecida que um homem solteiro, possuidor de uma boa fortuna, deve estar necessitado de uma esposa.”) e Anna Karenina (“Todas as famílias felizes são iguais, mas cada família infeliz é infeliz à sua maneira.”), mas nenhum fala tanto ao meu coração quanto o de “A Hora da Estrela”:

Tudo no mundo começou com um sim. Uma molécula disse sim a outra molécula e nasceu a vida. Mas antes da pré-história havia a pré-história da pré-história e havia o nunca e havia o sim. Sempre houve. Não sei o quê, mas sei que o universo jamais começou.

Agora, se você nunca leu “A Hora da Estrela”, pode dar uma chance a obra da autora ucrano-brasileira Clarice Lispector assistindo a adaptação realizada em 1985 pela cineasta Suzana Amaral, que voltou aos cinemas no último 16 de maio em cópias restauradas digitalmente em 4K.

O longa conta a história da datilógrafa Macabéa (vivida magistralmente por Marcélia Cartaxo, ganhadora do Urso de Prata de melhor atuação em Berlim) uma migrante vai do Nordeste para São Paulo tentar a vida. Órfã, a personagem parece pedir perdão o tempo todo por estar viva, quase se desculpando por ter sobrevivido a sina dos pais. Macabéa é invisível, invisibilizada e desencaixada do mundo.

A interação com as outras personagens acentua o caráter de estranheza que Macabéa sente de sua realidade (“O que você acha dessa Macabéa, hein?” “Eu acho ela meio esquisita”) onde a proximidade física reservada a ela é oferecida apenas pelas viagens de metrô aos domingos.

As coisas parecem mudar quando ao mentir ao chefe – copiando sua colega de trabalho Glória – dizendo que no dia seguinte irá tirar um dente para, na verdade, tirar um dia de folga. Passeia pela cidade e encontra Olímpico (José Dumont) a quem passa a ver com frequência. Infelizmente, mesmo ele, não entende a inocência e esse desencaixe de Macabéa, deixando-a.

“A Hora da Estrela” de Suzana Amaral traz a estética da fome tão cara ao Cinema Novo de Glauber Rocha não apenas na falta, ressaltada em oposição as personagens que orbitam a curta vida de Macabéa, mas no desalento, no desamparo e, principalmente, no abandono que, quando negado em certa altura pela mentira esperançosa da cartomante charlatã (vivida por Fernanda Montenegro), culmina na estúpida tragédia que ocorre com a protagonista.

Se no começo de tudo, como disse Clarice, sempre houve o nunca e o sim, para Macabéa e os seus “sim senhor” o universo reservou apenas o grande não que Suzana Amaral captou como ninguém.

Nota 5 de 5

Avaliação: 5 de 5.
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Burburinho

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