Reviews e Análises
Medida Provisória – Crítica

Em um futuro não tão distópico, o governo brasileiro decreta uma medida provisória que obriga os cidadãos negros a migrarem para a África. A princípio uma sugestão, no melhor estilo “Brasil ame-o ou deixe-o”, e depois transformado em perseguição, o filme mostra o que pode acontecer quando o extremismo é levado a sério.
O argumento maravilhoso do roteiro de que a iniciativa seria uma forma de reparação ao nosso passado escravocrata e assassino é simplesmente genial. Pois é real. Principalmente nos dias de caquistocracia em que vivemos.
A obrigatoriedade de expulsão do país de cidadãos negros, que agora são chamados de melanina acentuada, em mais uma crítica ao politicamente correto que nos assola, afeta diretamente a vida do casal Capitú (Taís Araújo) e de Antonio (Alfred Enoch), assim como a do primo André (Seu Jorge), que divide apartamento com os dois.
Quando a coisa toda acontece e a polícia começa a arrastar as pessoas e levá-las contra a sua vontade para a deportação, vemos tudo o que pode acontecer em um futuro (ou presente) onde as regras são escritas de cabeça para baixo. Quilombos são reerguidos, os apartamentos se tornam os últimos refúgios das pessoas que ainda resistem, a tortura e o assassinato relembram o período mais obscuro de nossa história.
O filme é uma adaptação da peça “Namíbia, Não”, de Aldri Anunciação e dirigido por Lázaro Ramos. Com uma câmera leve, a história corre por nossos olhos como um prenúncio de um desastre. E nos sentimos impotentes, assim como os protagonistas. Que precisam lutar, mas são vencidos pelo sistema. Como resistir? Como lutar sem agredir? Questões como vingança e justiça olho por olho e dente por dente também são colocadas em pauta de forma brilhante.
Um filme mais do que necessário para tempos desnecessários. Um brado retumbante que precisa ser ouvido e interpretado. Até onde vamos?
Reviews e Análises
Lispectorante – Crítica

Lispectorante de Renata Pinheiro, diferente de outras produções baseadas na obra de Clarice Lispector – A Hora da Estrela (1985), de Suzana Amaral e A Paixão Segundo G.H. (2023) de Luiz Fernando Carvalho – não tem foco, especialmente, em nenhum texto da autora, mas consegue captar seu universo e soluciona o fluxo de consciência, característica primeira de sua literatura, através de cenas marcadas pelo fantástico.
Durante o longa acompanhamos Glória Hartman – uma artista plástica em crise, recém-divorciada e sem dinheiro – que retorna para sua terra natal, indo visitar sua tia Eva. Ao encontrar um guia de turismo com um grupo acaba interessando-se pelas informações sobre a casa de Clarice Lispector que, a partir daqui será o lugar do onírico e de profundas e solitárias discussões existenciais, preenchido por ruinas de um mundo apocalíptico.
Lispectorante, palavra inventada tradução do intraduzível, Oxe, pra mim listectorante é uma droga ilegal feita numa manhã de um Carnaval que se aproxima. Pra expectorar mágoas, prazeres, visgos e catarros num rio que vira charco
Entre o fazer artístico – sempre mostrado de forma fantástica, surrealista – e a necessidade de sustento, Glória se apaixona por Guitar, um artista de rua mais jovem com quem inicia um romance.
A escolha de Marcélia Cartaxo para viver Glória nos ajuda a encaixá-la no mundo de Clarice: é como se ela sempre tivesse estado ali, vivendo e sentindo todas aquelas subjetividades, mesmo sendo uma personagem de atitudes muito diferentes de Macabéa, que a atriz viveu em A Hora da Estrela. Glória é livre, mas seu momento de vida – uma mulher madura, recém-divorciada, sem dinheiro e em um “lance” com um homem mais jovem – nos remete as inseguranças de Macabéa – jovem, tímida e descobrindo o mundo. Ambas estão em transição!
Lispectorante é poético e tem um desfecho que não surpreende e nisso ele é excelente: não há outro caminho para o sentir do artista que as suas incertezas.
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