Reviews e Análises
Marighella – Crítica
Marighella conta a história do guerrilheiro/terrorista/revolucionário baiano Carlos Marighella (Seu Jorge) que durante os anos de ditadura militar no Brasil, lutou pelo retorno da democracia ao País. E lutou mesmo, com todas as letras. Luta armada. Por conta disso foi, durante muito tempo, visto como o inimigo número 1 do Brasil. O filme é dirigido por Wagner Moura, que também é responsável pelo roteiro, junto com Felipe Braga. Baseado no livro de Mário Magalhães, o filme foca na guerrilha de Marighella e seus companheiros no ano de 1968, com alguns flashbacks para 1964. Moura tem uma direção crua, câmera na mão, fotografia rústica, com foco necessário na atuação de seu elenco, que está impecável.
Seu Jorge está muito bem no papel principal, trazendo um certo desespero ao personagem, que tudo o que quer é livrar o Brasil da ditadura, seja lá qual for o meio necessário. Em um determinado momento do filme, ele olha para a câmera e admite ser um terrorista sim, causando uma sensação amarga na boca de quem assiste o filme. Esse talvez seja um dos maiores méritos da fita. Apesar de humanizar muito Marighella, com sua relação com a família, filhos e companheiros de luta, a história mostra que Marighella era sim um fora-da-lei. Que usou da força e da violência para conseguir o que queria e fazia isso com ideais considerados subversivos, comunistas ou libertários, depende da sua vertente política.
Mas o filme mostra que, na situação da época, ou era isso ou aceitar a ditadura. E Moura não poupa esforços ao mostrar a violência da repressão. As cenas de tortura e execução de presos políticos são cruas e realistas, daquelas de se querer virar um pouco o rosto para não absorver tudo aquilo. E, novamente, boa parte desse mérito é da atuação. Bruno Gagliasso está surpreendente no papel de Lúcio, um delegado da PM encarregado de perseguir Marighella e que é a encarnação de todo o mal. Violento e mau-caráter, Lúcio é o representante de todo o esgoto que foi a ditadura militar no Brasil.
As cenas das ações terroristas e a repressão militar são realistas demais, chocantes demais e de meter medo. O som do filme contribui muito para isso, com o barulho do pipoco dos tiros reverberando por toda a sala. Com isso, a coisa toda ganha um ar documental que lembra outros já clássicos nacionais como Cidade de Deus e Tropa de Elite. Ao mostrar tudo de forma muito real, Moura conversa com o espectador trazendo ele para os anos de chumbo, para que ele próprio possa tirar as suas conclusões sobre o período. Uma época que o Brasil passou e que devemos nos esforçar para manter longe da nossa realidade.
O filme traz ainda uma sequência final necessária nos dias de hoje, em que patriotismo é confundido com racismo, elitismo e preconceito. Uma mensagem obrigatória para dias em que o conceito de liberdade de expressão têm sido distorcido para justificar discurso de ódio e fake news para a manipulação das massas. Um filme imprescindível para ajudar a trazer de volta ao eixo uma população que acha bonito colocar a camisa da seleção e pedir fechamento do STF e a volta da ditadura. Um tapa na nossa cara e um grito cantado de forma furiosa, mostrando o verdadeiro significado dos versos “verás que um filho teu não foge à luta, nem teme, quem te adora, a própria morte”.
Reviews e Análises
Ainda Estou Aqui – Crítica
Existem alguns filmes que ao assistirmos apenas os primeiros dez minutos já temos a percepção de estarmos diante de um clássico ou de uma obra-prima. É o caso de O Poderoso Chefão, por exemplo. Ou de Cidade de Deus, para trazer mais perto da nossa realidade brasileira. Não é o caso de Ainda Estou Aqui, novo filme de Walter Salles que chega aos cinemas dia 7 de novembro.
Não. Ainda Estou Aqui demora um pouco mais para percebermos que estamos diante de um dos melhores filmes brasileiros já feitos. E isso é fácil de entender, simplesmente porque a história é contada no tempo dela, sem pressa de acontecer. Mas quando você chegar na cena em que a personagem principal se vê presa, você não vai esquecer desse filme nunca mais na sua vida.
Baseado no livro de mesmo nome de Marcelo Rubens Paiva, o filme conta a história da família de Marcelo, que em 1970 passou pela traumatizante experiência de ter o pai, o ex-deputado e engenheiro Rubens Paiva, simplesmente levado arbitrariamente pela Ditadura Militar e nunca mais retornar.
Ainda Estou Aqui começa te estabelecendo como um observador da família. E como ele leva tempo para te mostrar todo o cotidiano e te apresenta os personagens aos poucos, o espectador vai se tornando parte daquele núcleo familiar. Quando as coisas vão ficando sinistras, você já está envolvido e consegue sentir a mesma angústia e desespero que a família sentiu.
Fernanda Torres está simplesmente deslumbrante como Eunice Paiva. Forte, aguerrida, destemida, o que essa mulher aguentou não foi brincadeira. E Fernanda transmite isso como nenhuma outra atriz seria capaz. Selton Mello interpreta Rubens Paiva com muita simpatia e tenacidade. Simples sem ser simplório. Você literalmente quer ser amigo dele.
O elenco da família, crianças e adolescentes também está simplesmente perfeito. Todos impecáveis, assim como todo o elenco de apoio. Destaque também para a ponta da diva Fernanda Montenegro, como a Eunice idosa que, em no máximo cinco minutos de tela e sem dizer uma palavra, mostra porque é a maior atriz de todos os tempos.
Com um roteiro muito bem escrito e uma direção impecável, aliados a uma fotografia perfeita, é impossível apontar qualquer defeito neste filme. Com uma temática ainda necessária nos dias de hoje, é um dever cívico assistir a Ainda Estou Aqui, o melhor filme de 2024, sem sombra de dúvida.
Nota 5 de 5
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