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Reviews e Análises

O Homem Cordial – Crítica

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O Homem Cordial é daqueles filmes que jogam a realidade na tua cara. Nua e crua. E você que lide com isso depois que sair da sala de cinema. E para um país que anda meio perdido socialmente, culturalmente, politicamente e humanamente, isso é mais do que necessário.

O filme, dirigido por Iberê Carvalho, tem roteiro dele e também de Pablo Stoll e conta a história de Aurélio (Paulo Miklos), vocalista de uma banda de rock que fez muito sucesso no passado e agora, bem em seu retorno aos shows, se vê envolvido em uma polêmica. Aurélio foi filmado por um celular em uma confusão no meio da rua envolvendo um garoto negro de onze anos e um policial que termina sendo assassinado. O artista acaba sendo cancelado pelas redes sociais e pela mídia que aparentemente distorcem o que aconteceu, fazendo com que ele seja responsabilizado pela morte do policial. Aurélio, então, vê-se envolto em uma única noite tensa e violenta nas ruas de São Paulo e, para sair da situação, vai contar com a ajuda de uma jornalista de mídia independente chamada Helena (Dandara de Morais) e do ex-parceiro musical Béstia (Thaíde).

O tema principal do filme é o racismo estrutural brasileiro e sobre como a polícia, em seu conceito, está inserida na nossa sociedade para garantir o privilégio branco. O cancelamento das redes sociais também é muito presente na história e serve para mostrar como as redes podem ser usadas tanto para o mal quanto para o bem. Além disso, há também a sociologia do termo “O Homem Cordial” do título. Esse é um conceito que foi desenvolvido pelo historiador e sociólogo brasileiro Sérgio Buarque de Holanda no livro Raízes do Brasil, publicado originalmente em 1936. Segundo o livro, a cordialidade faz com que o brasileiro sinta, ao mesmo tempo, o desejo de estabelecer uma intimidade e o repúdio a qualquer convencionalismo ou formalidade social.

Isto estabelece que as relações familiares continuem a ser o modelo obrigatório dentro de qualquer composição social, ou seja, não há uma distinção entre o público e o privado, entre o Estado e a família. Isso fala muito sobre como os grupos sociais, políticos e trabalhistas se enxergam no Brasil e como há união para defender os interesses privados, independentemente de legalidades ou ilegalidades. “Fiz pela minha família”, justifica tudo.

O filme também discute muito bem a questão do efeito de manada criado nas redes sociais, onde um grupo mais falante consegue arrebanhar a opinião de pessoas de forma irracional, sem análise de fatos. Como cada comentário, cada foto ou vídeo postado, cada compartilhamento de uma fake news pode impactar a vida de pessoas no mundo real. E principalmente como esse impacto é proporcional e como ele reverbera de forma diferente dependendo do meio social em que você está inserido.

O uso de muitos planos fechados em close-up e planos desfocados, apesar de terem um propósito claro narrativo, cansam um pouco e deixam o começo do filme pouco criativo. Mesmo assim, a direção do filme é muito bem feita. Apesar de ter achado em alguns momentos o diálogo dos atores meio engessados pelo texto, sem naturalidade, no geral as atuações estão muito boas. Destaque para a participação do grande Thaíde como o Béstia, que está bem solto no papel.

O Homem Cordial estreia dia 11 de maio, mas já venceu as categorias de Melhor Ator (Paulo Miklos) e melhor Trilha Sonora no Festival de Cinema de Gramado.

Avaliação: 4 de 5.
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Lispectorante – Crítica

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Lispectorante de Renata Pinheiro, diferente de outras produções baseadas na obra de Clarice Lispector – A Hora da Estrela (1985), de Suzana Amaral e A Paixão Segundo G.H. (2023) de Luiz Fernando Carvalho – não tem foco, especialmente, em nenhum texto da autora, mas consegue captar seu universo e soluciona o fluxo de consciência, característica primeira de sua literatura, através de cenas marcadas pelo fantástico.

Durante o longa acompanhamos Glória Hartman – uma artista plástica em crise, recém-divorciada e sem dinheiro – que retorna para sua terra natal, indo visitar sua tia Eva. Ao encontrar um guia de turismo com um grupo acaba interessando-se pelas informações sobre a casa de Clarice Lispector que, a partir daqui será o lugar do onírico e de profundas e solitárias discussões existenciais, preenchido por ruinas de um mundo apocalíptico.

Lispectorante, palavra inventada tradução do intraduzível, Oxe, pra mim listectorante é uma droga ilegal feita numa manhã de um Carnaval que se aproxima. Pra expectorar mágoas, prazeres, visgos e catarros num rio que vira charco
Entre o fazer artístico – sempre mostrado de forma fantástica, surrealista – e a necessidade de sustento, Glória se apaixona por Guitar, um artista de rua mais jovem com quem inicia um romance.

A escolha de Marcélia Cartaxo para viver Glória nos ajuda a encaixá-la no mundo de Clarice: é como se ela sempre tivesse estado ali, vivendo e sentindo todas aquelas subjetividades, mesmo sendo uma personagem de atitudes muito diferentes de Macabéa, que a atriz viveu em A Hora da Estrela. Glória é livre, mas seu momento de vida – uma mulher madura, recém-divorciada, sem dinheiro e em um “lance” com um homem mais jovem – nos remete as inseguranças de Macabéa – jovem, tímida e descobrindo o mundo. Ambas estão em transição!

Lispectorante é poético e tem um desfecho que não surpreende e nisso ele é excelente: não há outro caminho para o sentir do artista que as suas incertezas.

Avaliação: 3 de 5.
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Burburinho

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