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Gibiteca Refil

Mulher Maravilha: a minha melhor super-amiga

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Quando vou escrever um texto me imponho uma pergunta a ser respondida e, pela primeira vez, fiquei quase uma hora olhando para a tela do computador sem escrever nada, enquanto lia repetidamente “O que a Mulher Maravilha representa pra mim?”

Toda vez que repetia a pergunta, uma torrente de ideias e ideais se confundiam. Parei tudo e fui até ao que achei que seria a minha grande fonte: minha estante de quadrinhos. Entre o final da minha coleção do Batman, apoiada em Bruce Wayne: Fugitivo, e o começo da minha coleção do Superman, iniciada com Para o homem que tem tudo de Alan Moore, estavam os volumes e encadernados da Mulher Maravilha. Ri ao perceber a posição, pois não foi intencional. Tirei os volumes da estante e, enganchado em um deles estava uma revistinha de 1983 da Luluzinha.

Para a ciência a memória é acionada quando um bando de neurônios recebem sinais nervosos dos axônios de outro bando de neurônios. Chamam isso de sinapse. A ciência que me desculpe, mas a memória é como um truque de mágica: basta um gosto, um cheiro, um toque, uma música e toda uma experiência, uma sensação, um sentimento simplesmente aparecem. Para mim bastou a Luluzinha.

Lembrei-me de uma garotinha que, ainda não alfabetizada, saia carregando um gibi na mão pedindo para os adultos lerem para ela. A impaciência deles e a desconfiança dela – “é isso mesmo que está escrito aí?” – fez com que seu grande sonho de criança fosse ir para a escola para aprender a ler. Esta epopeia só tinha descanso quando sua mãe ligava a TV e ela ouvia:

Super-Homem, Mulher Maravilha, Batman e Robin, Aquaman, Vulcão Negro, Samurai, Chefe Apache, Eldorado. Juntos formam a maior força do mundo, dedicados a Liberdade, a Paz e a Justiça, para toda a humanidade. Eles são os Super Amigos.

Eu adorava a Mulher Maravilha dos Super Amigos! Ela era inteligente, forte, bonita e tinha um jato invisível – gente, um jato invisível! – mas, todo esse amor tinha um motivo principal: ela fez com que eu entrasse nas brincadeiras dos meninos. Eu fui criada cercada de meninos e, enquanto meu irmão e nossos amigos eram o Super-Homem (ninguém falava Superman na época), o Batman e o Aquaman – vai entender cabeça de criança – eu era a Mulher Maravilha. Nenhum deles dizia que eu não podia bater em um vilão ou que não podia pilotar um avião. Tínhamos a mesma importância no grupo – certo, talvez o Aquaman não tivesse – brincando juntos e, o mais importante: em pé de igualdade.

Acredito que tudo o que vivemos criam a matéria do que somos. Mais que ossos, músculos, pele e gordura – é tá difícil – somos feitos de experiências e emoções que, mesmo não estando na superfície, refletem em nossas ações e ideais. Sendo assim, respondo de uma vez a minha pergunta: A Mulher Maravilha, em um momento importante da minha – ainda pequena – vida foi a representação que eu precisei e participa, ainda hoje, do meu ideal de igualdade.

Mais leve, sabendo que o texto sairia, retornei todas as publicações para seus lugares na estante – “será que devo mantê-la onde estava, entre esses dois?”: – menos Mulher Maravilha: Deuses e Mortais de George Perez. Lembro que, quando li, fiquei maluca pela mitologia grega, mas esta já é uma outra história…

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Gibiteca Refil

#MulherMaravilha80anos – Do Polígrafo ao Laço da Verdade

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“Bela como Afrodite; sagaz como Atena; dotada da velocidade de Mercúrio e da força de Hércules – nós a conhecemos como Mulher-Maravilha. Mas quem pode nos dizer quem é ela ou de onde ela veio?” – All-Star Comics, dezembro de 1941

A Mulher-Maravilha não foi a primeira super-heroína dos quadrinhos e definir esse posto é algo bastante complexo. Levando-se em conta o que entendemos como super-herói (ter uma identidade secreta, poderes e usar um uniforme) o consenso é que a primeira super-heroína dos quadrinhos é a Hawkgirl, conhecida por aqui como Mulher-Gavião. Como explicar, então, que tamanha popularidade de Diana faça com que nem cogitemos acreditar nisso? É simples: o conceito.

Muitas personagens femininas foram criadas a partir do clichê Ms. Male Character, isto é, a versão feminina de uma personagem masculina. Shiera era a versão feminina do Gavião Negro, além de sua parceira amorosa, assim como as primeiras concepções de Miss Marvel e Batwoman. A Mulher-Maravilha já foi criada como uma personagem independente, com seu próprio mundo fictício e histórias em consonância com as discussões do período.

A primeira aparição de Diana no universo DC se deu em dezembro de 1941 na All-Star Comics número 8. Essa ainda não contava a origem da personagem, mas a história das Amazonas e o motivo delas irem parar em Themyscira. A narrativa do nascimento de Diana, que permaneceria intacta até sua reformulação pós-Crise, seria apresentada apenas em Wonder Woman número 1: esculpida por Hipólita, a partir do barro de Themyscira, a escultura desperta na Rainha das Amazonas um sentimento profundamente maternal e o desejo de que a forma tome vida, em uma releitura do mito de Pigmaleão e Galatéia. Afrodite atende ao pedido de Hipólita, trazendo a criança à vida, dando-lhe o nome de Diana, em homenagem a irmã gêmea de Apolo, deusa da Lua e da caça. O que nos faz pensar: como seus criadores chegaram a essas referências?

“Sinceramente, a Mulher-Maravilha é propaganda psicológica com vistas ao novo tipo de mulher que, na minha opinião, deveria dominar o mundo.”  William Moulton Marston, março de 1945

A criação da personagem é atribuída ao roteirista Charles Moulton, pseudônimo do psicólogo William Moulton Marston, conhecido também como o inventor do polígrafo (a máquina da verdade). Já a concepção visual ficou a cargo de Harry G. Peter. Sempre esquecida nesta equação, porém, estava Elizabeth Holloway Marston esposa de William Marston e a quem o próprio se referia como coautora da personagem.

A luta pela igualdade feminina, presente nas primeiras histórias da Mulher-Maravilha – segundo Jill Lepore na biografia A história secreta da Mulher-Maravilha – remonta os primeiros anos de Marston em Harvard com o movimento pelo voto feminino e, principalmente, após ele ter ouvido a palestra da sufragista inglesa Emmeline Pankurst. Quase impedida de falar na universidade, simplesmente por ser mulher, Pankurst deixou Marston “fascinado, emocionado”. Já as referências gregas, possivelmente vieram de Holloway que amava a língua e as histórias que estudou em seus anos no ensino médio.

Desde a palestra de Emmeline Pankurst, a Mulher-Maravilha levou três décadas para aparecer, quando o seu principal idealizador já tinha 48 anos. Marston, após afirmar que via nos quadrinhos um grande potencial educacional, tornou-se uma espécie de psicólogo consultor da DC Comics. Foi aí que sugeriu ao editor Max Gaines uma super-heroína. A resposta inicial de Gaines foi dizer que personagens pulp e de quadrinhos femininas sempre eram um fracasso. Marston engendrou em argumento todos os anos em que defendeu os direitos das mulheres, recebendo a resposta “fiquei com o Superman depois que todo syndicate do país recusou. Vou dar uma chance a sua Mulher-Maravilha!”. Como condição o próprio Marston deveria escrever as histórias e se depois de seis meses os leitores não gostassem, essa seria descontinuada. Parece que acabou dando certo!

Como dito, Mulher-Maravilha não foi a primeira super-heroína, de fato, mas acredito que se tornou a primeira super-heroína por direito. Assim, convido você a comemorar durante os próximos meses os 80 anos de suas histórias e imaginário criados para a princesa amazona.

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