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Reviews e Análises

Asteroid City – Crítica

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Asteroid City é o mais novo filme de Wes Anderson e talvez seja o mais difícil de descrever. Mas a primeira coisa que você precisa saber antes de assistir é que ele não é apenas um produto de entretenimento. Ele é arte. É poesia meditativa sobre o sentido de nossa existência na Terra e da vida em geral. É ironia disfarçada de comédia sem sentido. É metalinguagem em cima de metalinguagem. É existencialismo filosófico, metáfora, alegoria e simbolismo, tudo misturado. Então, se você quer apenas se divertir, melhor escolher qualquer outro “blockbuster” em cartaz. Porque Asteroid City vai querer fazer você pensar.

Esse texto pode conter spoilers da trama. Siga por sua conta e risco.

Pelo trailer, entendemos que Asteroid City é sobre uma minúscula cidade no meio do deserto que todo ano celebra o aniversário da queda de um asteroide. Durante o encontro, há uma interação com um ser de outro planeta e aí tudo muda na vida daquelas pessoas, que agora tentam entender mais sobre suas próprias vidas. Só que na verdade tudo vai muito além.

O filme começa com um programa de televisão, em preto e branco, com o Apresentador (Bryan Cranston), falando sobre o processo criativo do autor Conrad Earp (Edward Norton) e a história de uma peça de teatro chamada Asteroid City. O que vemos em “cores” no filme seria a tal peça, sendo encenada diretamente para nós, plateia. Interessante aqui que a “peça” parece realista e a “vida real”, ou seja, os bastidores, parecem encenados, com um dispositivo cênico barato e sem tridimensionalidade alguma.

A “peça” conta com o envolvimento de vários personagens. Temos Augie Steenbeck (Jason Schwartzman), fotógrafo profissional, recém viúvo, com o filho adolescente Woodrow (Jake Ryan) e as trigêmeas de cinco anos de idade. Esse núcleo ainda envolve o personagem de Tom Hanks, o avô Stanley, que odeia o genro e o culpa pelo falecimento da mãe das crianças. Temos aqui o tema do luto como foco.

Outro ponto da história se fixa na famosa atriz Midge Campbell (Scarlett Johansson) e sua filha Dinah (Grace Edwards). Midge está se preparando para um próximo papel e tem sérios problemas em lidar com a auto-imagem e a fama. Ela veio para Asteroid City para acompanhar a filha que receberá um prêmio. O filme ainda conta com as participações de Maya Hawke como a professora June, Rupert Friend como o cowboy Montana, Jeffrey Wright como o General Gibson, entre outros.

Todas as principais características de um filme de Wes Anderson estão presentes aqui. A simetria fotográfica, as cores eletrizantes, a comédia sofisticada, as atuações apáticas de propósito, a quebra de quarta parede. Acho que não tem nada mais Wes Anderson do que esse filme.

A direção de arte, a fotografia, a trilha sonora, tudo é perfeito. E mesmo assim, o roteiro é o que mais vai ficar na tua cabeça. O sentido da vida, o existencialismo, a razão do porque estamos fazendo o que estamos fazendo, os limites da realidade e da fantasia. Tudo isso é questionado. “Você não pode acordar, se não cair no sono”. Parece que não faz sentido, mas faz.

Em determinado momento, o próprio autor da peça é questionado sobre o que é Asteroid City e ele responde que é sobre a “infinitude e não sei mais o quê”. Em outro momento, o personagem/ator/intérprete Jason Schwartzman desiste de entender o que está acontecendo dentro de Asteroid City e sai do cenário, passa para o mundo dos bastidores da peça, e vai questionar o diretor interpretado por Adrien Brody. Ele diz que não está vendo sentido naquilo tudo. No que o diretor responde que nem sempre precisamos entender nada, só continuar a contar a história. Quantas vezes a nossa vida pareceu não fazer mais sentido e a gente teve que só continuar vivendo?

Acho que Asteroid City não é um filme fácil de digerir e vai precisar ser assistido diversas vezes antes de entendermos tudo o que Anderson quis passar ali. Vai ter muita gente dizendo que o filme é ruim, que não entendeu nada. Mas é arte em sua essência. Provocativo, instigante, belo e filosófico.

Avaliação: 5 de 5.
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2 Comments

2 Comments

  1. VALDIR FUMENE JUNIOR

    9 de agosto de 2023 at 11:14

    Em época em que heterotop prestam homenagens ao enfadonho Nolan, Anderson mostra o que é arte. Seus filmes não são de digestão rápida, ao mesmo tempo que não pesam, mas faz você comentar depois de o quanto foi prazeroso.

  2. Simões Neto

    10 de agosto de 2023 at 09:25

    Os filmes do Anderson sempre tiveram essa cara “teatral”: câmera fixa, cenários simples e fixos. Gosto de um filme que te faz pensar e, para mim, também é diversão. Vou assistir!

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A Hora da Estrela – Crítica

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Quando se é aficionado por livros é comum alguma mania: ler a última página, tentar não “quebrar” a lombada de calhamaços enquanto se lê ou usar qualquer coisa que estiver a mão como marcador de páginas. Eu coleciono primeiros parágrafos: escrevo em pequenos cadernos que guardo na estante junto com os volumes que lhes deram origem. Claro que existem os favoritos como o de Orgulho e Preconceito (“É uma verdade universalmente conhecida que um homem solteiro, possuidor de uma boa fortuna, deve estar necessitado de uma esposa.”) e Anna Karenina (“Todas as famílias felizes são iguais, mas cada família infeliz é infeliz à sua maneira.”), mas nenhum fala tanto ao meu coração quanto o de “A Hora da Estrela”:

Tudo no mundo começou com um sim. Uma molécula disse sim a outra molécula e nasceu a vida. Mas antes da pré-história havia a pré-história da pré-história e havia o nunca e havia o sim. Sempre houve. Não sei o quê, mas sei que o universo jamais começou.

Agora, se você nunca leu “A Hora da Estrela”, pode dar uma chance a obra da autora ucrano-brasileira Clarice Lispector assistindo a adaptação realizada em 1985 pela cineasta Suzana Amaral, que voltou aos cinemas no último 16 de maio em cópias restauradas digitalmente em 4K.

O longa conta a história da datilógrafa Macabéa (vivida magistralmente por Marcélia Cartaxo, ganhadora do Urso de Prata de melhor atuação em Berlim) uma migrante vai do Nordeste para São Paulo tentar a vida. Órfã, a personagem parece pedir perdão o tempo todo por estar viva, quase se desculpando por ter sobrevivido a sina dos pais. Macabéa é invisível, invisibilizada e desencaixada do mundo.

A interação com as outras personagens acentua o caráter de estranheza que Macabéa sente de sua realidade (“O que você acha dessa Macabéa, hein?” “Eu acho ela meio esquisita”) onde a proximidade física reservada a ela é oferecida apenas pelas viagens de metrô aos domingos.

As coisas parecem mudar quando ao mentir ao chefe – copiando sua colega de trabalho Glória – dizendo que no dia seguinte irá tirar um dente para, na verdade, tirar um dia de folga. Passeia pela cidade e encontra Olímpico (José Dumont) a quem passa a ver com frequência. Infelizmente, mesmo ele, não entende a inocência e esse desencaixe de Macabéa, deixando-a.

“A Hora da Estrela” de Suzana Amaral traz a estética da fome tão cara ao Cinema Novo de Glauber Rocha não apenas na falta, ressaltada em oposição as personagens que orbitam a curta vida de Macabéa, mas no desalento, no desamparo e, principalmente, no abandono que, quando negado em certa altura pela mentira esperançosa da cartomante charlatã (vivida por Fernanda Montenegro), culmina na estúpida tragédia que ocorre com a protagonista.

Se no começo de tudo, como disse Clarice, sempre houve o nunca e o sim, para Macabéa e os seus “sim senhor” o universo reservou apenas o grande não que Suzana Amaral captou como ninguém.

Nota 5 de 5

Avaliação: 5 de 5.
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